Juliana Maria: Todas as vidas importam?

 

Quando vemos a pergunta acima, sim é a nossa resposta. Uma resposta tão automática como muitas coisas que temos feito ao longo da nossa vida e não percebemos ou questionamos justamente porque vivemos no “automático”.  Acordamos pela manhã, tomamos um café, passamos a vista em nossas redes sociais, vamos ao trabalho, à faculdade, voltamos para casa, assistimos ao noticiário, comemos, dormimos e amanhã tudo de novo. A sociedade nos programa á rotina e estamos tão automatizados por ela que tudo aquilo que fazemos, pensamos ou respondemos segue essa mesma lógica.

Uma onda de protestos está tomando conta de todo o mundo, após a divulgação de um vídeo que mostra um homem negro sendo imobilizado por um policial branco com os joelhos em seu pescoço, em Minneapolis, nos Estados Unidos. George Floyd, que tinha 40 anos, foi levado inconsciente por uma ambulância logo após a abordagem policial e foi declarado morto ao chegar ao hospital. No vídeo feito por uma testemunha, que mostra Floyd imobilizado, o policial aperta durante 8 minutos e 46 segundos o pescoço do homem, que diz mais de uma vez que não consegue respirar. Nos minutos finais, Floyd não se mexe mais. Segundo a polícia local, ele foi detido por supostamente usar notas falsas em um mercado. Ele só queria respirar.

No recife uma mulher negra, empregada doméstica passeava com ao cães da patroa branca enquanto seu filho, Miguel Otávio de 5 anos estava no apartamento da família brincando com a filha da patroa. Em algum momento o menino sente falta da mãe e ao invés de lhe oferecer um biscoito, ou tentar acalentá-lo de alguma forma até que a mãe retornasse, a patroa coloca a criança sozinha no elevador para que vá em busca da mãe. Ele cai do 9º andar em morre. Ele só queria a mãe dele.

No Rio, João Pedro de 14 anos, foi baleado em casa pela policia enquanto brincava com os primos. João morreu a caminho do hospital. Ele só queria brincar em paz na segurança da sua casa.

Vocês ainda lembram-se de Agatha Vitoria? A criança de 05 anos estava dentro de uma Kombi, com a mãe, quando foi baleada nas costas em uma operação da policia.

Todas as vidas importam?

Todas as vidas importam mesmo?

De verdade?

George, Miguel, Agatha, Jennifer, Kauã, Kauê, Ketlleen. E milhares de outros morrem todos os dias de forma brutal. Sabe o que eles têm em comum? Todos eram negros e periféricos.

Todas as vidas importam?

Não. Em nossa sociedade não são todas as vidas que importam. Vidas negras, periféricas e pobres não valem nada. Suas mortes são tratadas com frieza e crueldade, como dados e estatísticas.

Olhe ao seu redor. Quantos colegas de trabalho negros você tem? E se os tem, quais os cargos que eles ocupam? Quantos colegas de faculdade negros você tem? Quanto negros você conhece que ocupam cargos e altas posições econômicas e sociais?

Olhe novamente ao seu redor. O racismo é o cimento que estruturas as nossas bases sociais. Talvez para nós, brancos, seja difícil sair da nossa bolha social, abrir os olhos e perceber isso. Também não é um processo fácil abrir mão dos privilégios que temos. Mas é preciso. É preciso enxergar além dos muros do condomínio, além do conforto dos nossos lares.

Vidas negras importam. As mães pretas não suportam mais chorar pelos seus filhos.

A vida de George Floyd importa.

A vida de Miguel Otávio Importa.

A vida de Agatha Vitória importa.

A vida de João Pedro Importa.

As vidas de Jennifer, Kauã, Kauê, Ketlleen e de milhares de negros que são massacrados todos os dias importam.

Precisamos descontruir as bases dessa sociedade racista e ressignifica-la.

É nosso papel enquanto cidadão e enquanto ser humano.

As unhas da patroa da mãe de Miguel estão impecáveis. Seu cachorrinho passeou e já está devidamente alimentado. Miguel foi sepultado, virou estatística e sua mãe chorará sua morte eternamente.

Vidas negras importam.

O apóstolo Pedro afirma no livro de Atos capitulo 10: 34 que “Deus não faz acepção de pessoas”. O amor, a misericórdia e a graça de Cristo são para todos. Somos nós com nosso racismo e nossa gama de preconceitos enraizados quem dificultamos seu alcance.

Que possamos sair do “automático” e recuperar a humanidade. Que possamos de fato e de direito amar o próximo e valorizar a sua vida.

Precisamos falar sobre racismo. Na escola, no trabalho, em casa, na igreja, na faculdade, nas ruas, nas redes sociais em todos os lugares possíveis e impossíveis.

É preciso mudar. Agora. Não amanhã ou depois. Agora.

Vidas negras importam!

 

Juliana Maria, 08.06.2020

 

Juliana Maria é servidora pública, discente do curso de letras da Universidade do Estado da Bahia, nordestina de coração, alma e espírito, mãe solo, cristã protestante, Líder de Jovens da Primeira Igreja Batista em Euclides da Cunha e nas horas vagas “escrevinhadora”

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